A vegetação da Caatinga cobre a fronteira das cidades de Santa Cruz do
Piauí e Picos. A última reserva de biosfera do Brasil foi criada em 2001
para conservar essa área de 198 mil km2
A Caatinga é considerada por especialistas o bioma brasileiro mais
sensível à interferência humana e às mudanças climáticas globais. Apesar
disso, apenas 7,5% de seu território está protegido em Unidades de
Conservação (UC) e apenas 1,4% dessas reservas são áreas de proteção
integral.
O alerta foi feito pelo biólogo Bráulio Almeida Santos, do Centro de
Ciências Exatas e da Natureza da UFPB (Universidade Federal da Paraíba),
durante o quinto encontro do Ciclo de Conferências 2013 do BIOTA
Educação, organizado pelo Programa BIOTA-FAPESP no último dia 20.
"A região Nordeste tem 364 reservas registradas no Cadastro Nacional de
Unidades de Conservação [CNUC]. Apenas 113 [ou 31%] têm como objetivo
proteger a Caatinga, embora esse bioma seja predominante em todo o
semiárido brasileiro. É uma contradição que precisa ser revertida",
afirmou Santos.
Ainda segundo o levantamento feito pelo biólogo, quase metade das 113
UCs são particulares e apenas 9% delas têm plano de manejo. Na avaliação
de Santos, a situação reflete a ideia errônea, porém disseminada
durante muito tempo, de que a Caatinga seja um bioma pobre, homogêneo e
no qual não há "quase nada a ser preservado".
"A Caatinga sempre foi o patinho feio dos biomas brasileiros. Em
primeiro lugar, vem a preocupação com a Amazônia, a mata Atlântica e o
Cerrado. A imagem da Caatinga é a do solo rachado e a do gado morrendo
de sede, mas é a região semiárida com a maior biodiversidade do mundo."
Espécies desconhecidas
As espécies da Caatinga, no entanto, ainda são pouco conhecidas. Cerca de 41% do bioma nunca foi amostrado.
Até o momento, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente, foram
descritas na região 932 espécies de plantas, 241 de peixes, 79 de
anfíbios, 177 de répteis, 591 de aves, 178 de mamíferos e 221 de
abelhas. No caso da flora, mais de 30% das espécies descritas são
endêmicas, ou seja, não ocorrem em nenhuma outra região do mundo.
O índice de endemismo chega a 57% no caso dos peixes, 37% no caso de
lagartos, 12% dos anfíbios e 7% das aves, segundo dados apresentados por
Adrian Antonio Garda, do Centro de Biociências da UFRN (Universidade
Federal do Rio Grande do Norte), durante o evento.
"O número de espécies descritas pode parecer pequeno quando você
compara com os outros biomas brasileiros. Quando você compara com as
regiões desérticas mais bem estudadas da América, a Caatinga apresenta
bem mais do que o dobro do número de espécies e com altos níveis de
endemismo. Isso apesar de mais de 40% do bioma nunca ter sido
inventariado", disse Garda.
Na avaliação de Santos, falta massa crítica dentro das universidades e
de institutos de pesquisa locais para ampliar esse conhecimento e
difundi-lo entre e os formuladores de políticas públicas. Também é
preciso derrubar o mito de que a Caatinga esteja pouco alterada,
defendeu Santos. Estima-se que tenha sobrado apenas 54% do bioma. Os
Estados que mais desmataram foram Bahia, Ceará, Piauí e Pernambuco.
"Mas, ao contrário do que acontece no caso da mata Atlântica, não
sabemos com precisão o que já se perdeu do bioma e como estão
distribuídos os fragmentos restantes. Do ponto de vista da conservação, é
fundamental saber se são muitos fragmentos pequenos ou poucos
fragmentos grandes para pensar em como reconectar as paisagens", disse
Santos.
Reverter a perda de hábitat na Caatinga, no entanto, não é tarefa
simples, explicou o pesquisador da UFPB. A escassez de água na região
dificulta a fotossíntese e faz com que o bioma apresente uma resiliência
muito pequena à interferência humana.
Ameaças
O principal fator de degradação da Caatinga hoje é, segundo Santos, o
desmatamento praticado para obtenção de lenha e de carvão vegetal. Cerca
de um terço da lenha cortada é para uso residencial. A maior parte do
carvão vai para siderúrgicas e para os polos de gesso e cerâmica do
Nordeste.
O biólogo também citou como ameaças o uso indiscriminado de fogo em
práticas agropecuárias, a introdução de frutas exóticas à região e as
criações extensivas de caprinos, ovinos e bovinos. Outra importante
ameaça, por mais contraditório que pareça, é o uso excessivo de água
para irrigação agrícola.
"Na Caatinga, naturalmente, chove pouco e o solo é compacto e duro. Em
vez de a água ser rapidamente absorvida e conduzida para o lençol
freático, ela se acumula e traz os sais e os nutrientes existentes no
solo para a superfície. Quando a água evapora, ocorre a salinização do
solo, o que compromete a vegetação e a agricultura", explicou Santos.
De acordo com o pesquisador, já existem na região núcleos de
desertificação – áreas com alto grau de degradação ambiental onde o solo
está exposto e exibe alto grau de erosão, há pouca diversidade
biológica e pouca cobertura vegetal.
"O polígono de maior risco de desertificação no Brasil está no
Nordeste. Por já ser naturalmente uma região semiárida, a Caatinga é o
bioma mais ameaçado pelas mudanças climáticas. À medida que o planeta
esquenta, o déficit hídrico, que já é grande, tende a crescer", alertou.
Luciano Paganucci, do departamento de Ciências Biológicas da UEFS
(Universidade Estadual de Feira de Santana), apresentou um panorama
sobre a flora da Caatinga, falando sobre sua origem, evolução e as
respostas adaptativas desenvolvidas para lidar com a falta d'água.
Fonte: http://noticias.uol.com.br/meio-ambiente/ultimas-noticias/redacao/2013/06/26/pouca-estudada-so-75-da-caatinga-esta-protegida-no-pais.htm