Não é só a natureza que é capaz de devastar áreas e levar vidas com
elas. Seres humanos, por meio de projetos de construção vastos, são
também capazes de causar terremotos: um poder que tem se mostrado um
desafio de compreender e controlar.
Barragens e grandes reservatórios são um dos culpados comprovados por
trás de terremotos artificiais; a relação entre o peso das piscinas de
água e a atividade sísmica foi estabelecida no início dos anos 1940,
após a construção da Barragem de Hoover.
Recentemente, um cientista da Califórnia foi checar se um
reservatório local poderia representar qualquer perigo. Para ele, este
reservatório em particular poderia estar em uma posição única de se
tornar uma ameaça.
O geofísico Tom parsons analisou o reservatório de Anderson, que fica
no topo da falha de Calaveras, a maior falha do sistema de San Andreas.
“Em termos de microatividade diária, essa é a falha mais ativa na área
da Baía de São Francisco”, disse Parsons.
O trabalho do geofísico começou muitos meses atrás, inspirado por um
cataclismo chinês, um terremoto de 2008 que talvez tenha sido causado
por um reservatório da represa Zipingpu, que fica a cerca de 5,5
quilômetros do epicentro do terremoto – o local onde se originou a
ruptura. O desastre de magnitude 7,9 deixou 87.587 pessoas mortas ou
desaparecidas e feriu mais de 374.000.
O reservatório de Anderson é comparável em tamanho ao reservatório da China que ficava perto da falha de Wenchuan.
Parsons esperava encontrar pelo menos algum tipo de correlação entre as
variações anuais nos níveis de água do reservatório de Anderson, que
mudam o seu peso, com a atividade sísmica ao longo da falha de
Calaveras.
Assim, o cientista analisou cerca de 25 anos de dados de nível de
água do reservatório (a partir de 1980), e construiu um modelo que
mapeou como a mudança de peso poderia afetar a falha. Parsons disse que
ficou um pouco surpreso com os resultados. “Eu esperava ver algo ruim.
Achei que esse reservatório era má notícia”, conta.
Ao invés disso, Parsons constatou que a mudança de peso e o estresse
resultante do reservatório não parecem estar relacionados com os sismos
relativamente pequenos que rompem regularmente da falha de Calaveras.
“Você pode colocar esse tipo de carga em uma falha sem consequências”,
explica.
Pradeep Talwani, professor de geofísica, apoia a descoberta de
Parsons de que o reservatório de Anderson provavelmente não representa
qualquer perigo. Mas outros podem representar.
Talwani passou mais de três décadas estudando terremotos induzidos
por reservatórios. Ele disse que quando os reservatórios começam a se
mover em torno da Terra, existem vários fatores trabalhando para isso: o
peso da água, a rapidez com que os níveis de água flutuam e as
propriedades hidrológicas da rocha abaixo do reservatório.
Pode ser fácil para a água escoar através de fendas na rocha e chegar
a uma falha abaixo. Se um canal de água, serpenteando quilômetros,
chega à falha, então grandes mudanças no reservatório afetarão a falha.
A água permite que as duas extremidades (reservatório e falha)
conversem entre si, deixando a energia viajar a partir da superfície até
a falha, movendo-se de forma por vezes perigosa.
Uma forma de retratar o processo é imaginar um desentupidor. Ele se
move rapidamente, mudando a pressão sobre uma obstrução e, finalmente,
removendo-a.
Grandes mudanças nos níveis de reservatório afetarão as falhas de uma
maneira similar, mas através de pressão da água em vez da pressão do
ar, e em uma escala de tempo muito mais longo.
Talwani apontou o exemplo mais famoso do mundo, um reservatório em
Koyna, na Índia, onde os níveis de água flutuam cerca de 40 metros
dentro de poucos meses. Esse reservatório causou um terremoto de
magnitude 6,3 em 1967, que matou 177 pessoas, feriu 2.000, e deixou mais
de 50.000 pessoas desabrigadas.
Talwani disse que o reservatório vem causando terremotos desde então.
“Esse é o único exemplo no mundo com terremotos em curso”, acrescenta.
Apesar de uma série de outros reservatórios terem causado terremotos na
década de 1960 na Grécia, China e Zimbábue, Talwani diz que muito
raramente eles causam desastres grandes e perigosos.
Quanto ao terremoto chinês de 2008, Talwani acredita que pesquisas
absolveram o reservatório próximo de qualquer responsabilidade. Parsons
também afirmou que não está claro de quem é a culpa, mas disse que
nenhum reservatório poderia ser a única causa de um terremoto tão
grande.
“As causas reais são do subcontinente indiano colidindo com a Ásia”,
fala Parsons. “Um reservatório não vai iniciar ou parar isso. No máximo,
pode ter acelerado o evento em um ano ou dois, mas certamente não o
causou”, finaliza.
De fato, poderia haver uma reviravolta irônica da pesquisa de Parsons
sobre o reservatório de Anderson e terremotos. “Podemos descobrir que,
paradoxalmente, é mais seguro construir reservatórios onde existem
muitos terremotos”, diz Parsons.
Embora ele afirme estar puramente especulando, Parsons disse que é
interessante pensar que, em áreas sismicamente ativas, milênios de
movimentos tectônicos podem fazer fissuras e buracos no interior da
Terra, semelhante a um cereal esmagado dentro de um caixa durante um
transporte, tornando mais difícil para a água do reservatório alcançar
uma falha.
“Não é idiota construir um reservatório perto de uma zona de falha
grave. Não acho que é seguro fazer isso em qualquer lugar, mas não é
absolutamente certo que se o fizer, você vai provocar um terremoto”,
conclui Parsons.
Fonte: http://hypescience.com/terremotos-artificiais-como-os-humanos-podem-desencadear-desastres/