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sexta-feira, 20 de março de 2015

Crise em São Paulo: como o país chamado de “Arábia Saudita da água” chega a esse ponto ?

crise agua sao paulo 
Temos o rio amazônico e outros rios poderosos, uma série de grandes barragens e um oitavo de toda a água doce do mundo. O Brasil é tão rico nesse recurso cobiçado que já foi chamado de “Arábia Saudita da água”.

E, ainda assim, na maior e mais rica cidade do país, as torneiras estão começando a ficar secas. Como chegamos a esse ponto?

Situação ainda crítica

Apesar das chuvas recentes, a situação não parece melhorar, pelo menos não substancialmente.

Um novo relatório da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico de São Paulo) divulgado na última terça-feira (17) mostrou que apenas o volume morto do Cantareira, principal sistema da capital paulista, se recuperou um pouco. Considerando ambos o volume útil e o volume morto, o índice oficial do reservatório foi calculado em 11,9% (150,6 bilhões de litros divididos por 1,3 trilhão de litros).

O sudeste enfrenta sua pior seca em quase um século. Antes da crise, o Cantareira abastecia 8,8 milhões de pessoas, mas hoje produz água apenas para 5,6 milhões. De um ano para cá, o sistema teve um corte de 56% na vazão.
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Qual a solução proposta para essa crise?

Para alguns, a questão não é se a água vai acabar, porque já acabou. Se, para a população, o governo do estado afirma que tudo vai ficar bem, atrás de portas fechadas o clima é mais tenso. Em uma reunião gravada secretamente que vazou para a imprensa cerca um mês atrás, Paulo Massato, um alto funcionário da Sabesp, disse que as pessoas deveriam sair de São Paulo “porque aqui não tem água, não vai ter água para banho, para limpeza da casa”.

Os funcionários da companhia reconheceram uma diminuição na pressão da água na rede de distribuição, mas as autoridades frequentemente insistem que isso não é o mesmo que o racionamento, semeando confusão e raiva entre os que já não estão ficando sem água.

As soluções prometidas para a crise são ambiciosas, mas ainda estão muito longe de se concretizar. Por exemplo, a Sabesp diz estar perseguindo um projeto grandioso para tirar água de uma bacia hidrográfica nas proximidades e construir novos reservatórios, mas esses esforços devem ser concluídos só em meados do próximo ano.

“É um sistema de água que claramente não tem sido bem gerido”, disse Newsha Ajami, diretor de política da água urbana no Stanford Woods Institute for the Environment, da Universidade Stanford (EUA), que recentemente se reuniu com autoridades brasileiras. “Eles apostam nesses megaprojetos, que deveriam ser a última solução, quando deveriam ter sido tomadas medidas agressivas meses atrás para reduzir o consumo e vazamento”.

Posicionamento absurdo

Estima-se que mais de 30% da água tratada da cidade é perdida em vazamentos e desvios. Em um comunicado, a Sabesp disse que estava buscando reduzir esses vazamentos. Chegou a oferecer descontos para a população diminuir o consumo de água, enquanto implementa multas exorbitantes para o alto consumo.

Racionamento “ainda está em discussão e estudo”, segundo a companhia, mas para as pessoas que já o experimentam, a posição das autoridades tem sido desconcertante, na melhor das hipóteses.

“Eu sinto ódio, ódio do governador e da Sabesp”, disse Márcia Oliani, 54 anos, ao jornal americano The New York Times, gerente de finanças de uma galeria de arte que suportou seis dias sem água em seu apartamento. “Eles falharam completamente em nos avisar, e só continuaram a mentir sobre isso ao longo tempo”.

A causa da crise

Especialistas dizem que as origens da crise vão além da recente seca e incluem uma série de fatores interligados: a onda de crescimento da população da cidade no século 20; um sistema cronicamente com vazamento que espalha grandes quantidades de água antes que ela possa chegar as casas; poluição notória nos rios Tietê e Pinheiros que atravessam a cidade; e a destruição das matas circundantes e zonas úmidas que historicamente embebiam a chuva, lançando-a em reservatórios.

O desmatamento na bacia do rio Amazonas, a centenas de quilômetros de distância, também pode ser adicionando à crise da água de São Paulo. Destruir a floresta reduz a sua capacidade de liberar umidade no ar, por sua vez diminuindo chuvas no sudeste do país, de acordo com um estudo recente.

O governo também aponta para o aquecimento global. “A mudança climática chegou para ficar”, disse Geraldo Alckmin, o governador do Estado de São Paulo. “Quando chove, chove muito, e quando há seca, é muito seca”.

E o pior ainda nem chegou

Especialistas em água alertam que a crise ainda poderia estar em seus estágios iniciais, o que significa que o problema da falta em São Paulo, a capital econômica do Brasil, poderia prejudicar ainda mais os esforços para fortalecer a economia nacional.

“Eles não atingiram o pior de tudo se não estão usando caminhões-pipa em grandes quantidades”, disse Steven Solomon, o autor de “Água: a luta épica para riqueza, poder e civilização”, comparando a crise com a situação nas cidades da Índia e Paquistão, onde moradores caçam água ou a compram no mercado negro.

Em um país onde a água abundante é uma fonte de orgulho nacional, a crise traz questionamentos de uma como cidade global poderosa como essa chegou a este ponto.
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Ignácio de Loyola Brandão, um escritor cujo romance de 1981 “Não Verás País Nenhum” imaginou uma São Paulo às voltas com a degradação ecológica e escassez crônica de água, disse a repórteres que não se surpreende com os problemas atuais da cidade, citando a relutância de muitas famílias de reduzir o seu próprio consumo de água e o que ele chamou de indiferença com que muitas pessoas no Brasil tratam escândalos ou desastres naturais. “A maioria não fica indignado com qualquer coisa”, disse, “como se estivéssemos passeando confortavelmente em direção a nossa própria morte”.

Fonte: http://hypescience.com/crise-em-sao-paulo-como-o-pais-chamado-de-arabia-saudita-da-agua-chega-a-esse-ponto/

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