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segunda-feira, 26 de março de 2012

Por que existe desequilíbrio entre matéria e antimatéria

Há algumas semanas, resultados científicos obtidos pelo Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (Cern) e por uma experiência que utilizou um reator nuclear chinês conquistaram manchetes, ao menos no mundo da Física de partículas.

No Cern, em Genebra, átomos de antimatéria foram estudados pela primeira vez, por algumas dezenas de cientistas que trabalham no projeto Alpha. Na China, o reator da baía de Daya, na província de Guangdong, perto de Hong Kong, foi usado para confirmar que os neutrinos podem em breve assumir posição central em nossa compreensão de como o universo surgiu. Os dois resultados envolvem um dos maiores problemas não resolvidos na física fundamental: por que resta matéria no universo?

Ainda bem que resta matéria, porque por matéria designamos partículas como os elétrons e prótons, que formam átomos, pessoas, planetas e estrelas. Mas a situação é precária. Para cada partícula de matéria no universo existem cerca de um bilhão de partículas de luz. Em outras palavras, o universo é feito quase inteiramente de luz.

As partículas de matéria, em vasta inferioridade numérica, parecem ser um minúsculo resíduo deixado da espetacular queima de fogos que ocorreu no segundo posterior ao Big Bang. Aquele momento fugaz viu a produção de quantidades praticamente iguais de matéria e antimatéria, combinadas em um plasma quente. À medida que o universo se expandia e resfriava, os antielétrons começaram a se fundir com os elétrons e os antiprótons a se fundir com prótons, convertendo-os em partículas de luz.

Dessa forma, matéria e antimatéria se cancelavam mutuamente, deixando para trás um universo repleto de luz --excetuado aquele ínfimo resíduo.

A mensagem é clara: algo deve ter interferido para impedir que matéria e antimatéria se cancelassem de modo perfeito, e sem isso não estaríamos aqui para refletir sobre nosso notável universo.

RACIOCÍNIO MATEMÁTICO

A existência da antimatéria foi prevista em 1928 pelo físico britânico Paul Dirac, que mais tarde ganhou um Nobel. O feito de raciocínio puramente matemático de Dirac foi comprovado quatro anos mais tarde quando Carl Anderson descobriu o antielétron, em seu laboratório na Califórnia. De acordo com as equações de Dirac, a antimatéria devia se comportar exatamente como a matéria comum, com a exceção de que portaria a carga elétrica oposta.

A "simetria" entre matéria e antimatéria é a razão para que tenham sido criadas em volume igual no nascimento do universo e para que se tenham cancelado mutuamente de maneira quase completa.

Hoje, experiências de Física de partículas e hospitais (ao usarem tomografia por emissão de pósitrons) de todo o mundo produzem partículas de antimatéria rotineiramente e, na maioria dos casos, elas se comportam exatamente como Dirac previu. Assim, o que impede a perfeita simetria entre matéria e antimatéria?

As partículas de matéria e antimatéria foram observadas, em raras ocasiões, agindo de maneira diferente uma da outra, em experiências de laboratório. Os quarks e antiquarks (partículas usadas para construir o núcleo do átomo), especialmente, às vezes se desviam da simetria perfeita.

Em 1973, em outro feito de raciocínio matemático, os físicos japoneses Makoto Kobayashi e Toshihide Maskawa concluíram que a única maneira de enquadrar os resultados anormais era supor que deveriam existir pelo menos seis tipos de quark na natureza.

Na época, apenas quatro tipos haviam sido observados; deve ter sido muito satisfatório para eles quando os tipos restantes foram enfim observados, em 1977 e 1995. Assim, ainda que cada átomo do universo seja formado por apenas dois tipos de quark, ao que parece os quatro tipos restantes desempenham papel central na quebra da simetria entre matéria e antimatéria.

Uma reviravolta fascinante revelou que as diferenças entre os quarks e antiquarks não bastariam para explicar o volume de matéria existente no universo. A mensagem é clara: ainda não compreendemos plenamente as sutis diferenças entre matéria e antimatéria.

ESFORÇO

A experiência Alpha, do Cern, é mais um esforço com o objetivo de descobrir essas sutis diferenças, mas o que torna o projeto Alpha especial é a singularidade do teste que ele pode executar. O Cern produz anti-hidrogênio desde 1995, mas apenas agora esses átomos podem ser desacelerados, aprisionados (usando ímãs) e estudados por sondas de micro-ondas.

A expectativa teórica é de que o hidrogênio e o anti-hidrogênio absorvam e emitam luz (micro-ondas são uma forma de luz) exatamente da mesma maneira. Os resultados até o momento confirmam a premissa, mas o projeto apenas começou e a experiência planeja realizar mensuração precisa; a descoberta de qualquer desvio entre o hidrogênio e o anti-hidrogênio seria nada menos que sensacional.

Até o momento, as experiências de Física de partículas se concentraram primordialmente nas diferenças entre os quarks e os antiquarks. Os mais recentes esforços quanto a isso foram liderados por cientistas que trabalham no projeto Beauty do Large Hadron Collider, no Cern, mas quarks não são a única possibilidade.

Os neutrinos também têm parceiros de antimatéria. Foram menos bem estudados, basicamente porque detectá-los é muito mais difícil; só nos últimos anos a situação começou a mudar.

A experiência com o reator da baía de Daya, na China, envolve contar o número de antineutrinos emanados de um reator nuclear; o resultado, publicado em 8 de março, fez uma contribuição decisiva ao demonstrar, sem sombra de dúvida, que os neutrinos também podem contribuir para o debate sobre matéria e antimatéria.



Fonte:uol.com.br

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